Dança na igreja pode ou não pode?


A dança, que começou, em algumas igrejas, como uma coreografia simples, executada ao som de hinos melódicos, ficou mais complexa, até evoluir para apresentações de balé e shows de hip-hop. Hoje, não há mais limites! Já temos o erotizante funk dentro de algumas igrejas, além coreografias quase idênticas (sem exageros) às performances dos dançarinos da Madonna, da Britney Spears e da Beyoncé.
Seria possível um retrocesso? Creio que não, pois os corações estão endurecidos. Mesmo assim, não posso me omitir, deixando de repisar (e reprisar) esse assunto nada simpático, que muitos preferem evitar para não irritar a maioria. Isso mesmo: a maioria. Afinal, se pedirmos a dez cristãos a sua opinião sobre a dança no culto, pelo menos metade se posicionará a favor dela. E a proporção aumentará mais ainda se os dez cristãos forem jovens e adolescentes.
Quando a dança passou a fazer parte da liturgia evangélica? Lembro-me de que, há pouco tempo, não víamos cultos com dança na igreja brasileira. No meu tempo de juventude, um ou outro falava em “dança no Espírito”, mas era um assunto muito controvertido. E a liderança, de maneira geral, não aceitava a dança como parte integrante do culto a Deus. De uns tempos para cá, alguns “revolucionários” descobriram a “América”! Aliás, dois destes “descobridores”, por ironia, estão presos na América do Norte por evasão de divisas.
Como não tem havido combate à secularização (Rm 12.1,2), nossos cultos estão cada vez mais carregados de atrativos para a “galera”. Apesar disso, em 1 Coríntios 14.26-40, vemos que o culto a Deus deve ser ordeiro, decente, tendo como elementos principais: o louvor a Deus (salmo), a exposição da Palavra (doutrina) e a manifestação multifacetada do Espírito Santo (revelação, língua e interpretação).
É triste ver como as superfluidades, as efemeridades, estão ocupando espaço no culto coletivo a Deus. Há algum tempo, os jovens passavam a noite em vigília, orando, estudando a Palavra. Assim acontecia nas décadas de 1980 e 1990. Hoje, os jovens vão para a “balada”, graças ao incentivo de líderes inescrupulosos, sem compromisso com a Palavra de Deus, movidos por outros interesses pessoais. Tais “revolucionários” dizem de boca cheia que são contrários ao legalismo, mas não se aperceberam de que são mundanos e porta-vozes do mundanismo.
O site YouTube contém vídeos e mais vídeos que mostram o que tem ocorrido em igrejas evangélicas lideradas por “revolucionários”. Excesso de louvor (se é que podemos chamar as cantorias intermináveis e as danças de louvor!), bem como números teatrais demorados, que para muitos desses “descobridores” têm o mesmo efeito da Palavra… Que engano! Nada substitui a exposição da sã doutrina! Caso contrário, o Senhor Jesus não teria dedicado boa parte de seu ministério à explanação das Escrituras. E Ele é o nosso modelo (1 Jo 2.6; Mt 11.29), e não pastores de megaigrejas, os quais inovam a cada dia, haja vista sua motivação principal ser a arrecadação de dinheiro (2 Co 2.17; 1 Tm 6.9).
Reafirmo, com inteira convicção (mesmo que eu fique só), que não há base bíblica nenhuma para se introduzir danças no culto, tampouco para chamá-las de ministério, como muitas igrejas estão fazendo. Os “revolucionários” citam Davi como um praticante da dança no culto a Deus. Mas a própria Palavra do Senhor depõe contra tal subterfúgio. Quem estuda a Bíblia sem preconceito, sabe que o próprio Davi, ao organizar o culto na antiga aliança, juntamente com Asafe, não fez nenhuma menção à dança. Pelo contrário, ele estabeleceu apenas cantores e músicos (1 Cr 25).
Ora, se Deus gosta tanto de dança, por que Davi, um homem segundo o coração de Deus — que inclusive dançou do lado de fora do templo —, não a incluiu na liturgia? Se ele e Asafe tivessem estabelecido dançarinos e coreógrafos, tudo ficaria claro. Não haveria nenhum obstáculo às danças na casa de Deus. Mas quem examina
as Escrituras à luz dos contextos histórico, cultural e literário sabe que a dança de Davi foi um ato único, pessoal, fora do Templo, isolado, e não litúrgico, exemplar ou inaugural.
Não só a dança de Davi, mas a de Miriã, também muito citada pelos “revolucionários”, foram atos à parte, fora do culto, patrióticos, pelos quais eles extravazaram a sua alegria. O Senhor não os condenou por suas danças, mas elas também não passaram a fazer, a partir de então, parte do culto coletivo a Deus. E isso explica o fato de não haver no Novo Testamento nenhum incentivo à dança no culto coletivo, apesar de muitos agirem como se houvesse apoio irrestrito a ela nas páginas sagradas.
Os “revolucionários” não querem saber de Bíblia. Apascentam-se a si mesmos e desviam o povo da verdade. Se eles pudessem, impediriam o povo de estudar as Escrituras. Como não podem fazer isso, a sua estratégia tem sido induzir as pessoas ao erro. Empregam, por exemplo, textos isolados dos Salmos como incentivo a toda prática mundana dentro das igrejas. Mas as duas passagens preferidas deles, os Salmos 149 e 150, não abonam a dança no culto.
Discute-se qual é a significação exata do termo original contido nos mencionados Salmos, o qual pode designar “dança”, “flauta” ou “shofar”. No entanto, deixando essa divergência de lado, digamos que, em Salmos 149.3 e 150.3, esteja escrito mesmo, à luz do hebraico: “Louvai ao SENHOR com dança”. Mesmo assim, os tais versículos não avalizam a dança no culto cristão. Lembremo-nos de que a mensagem da Bíblia se dirige a três povos: judeus, gentios e cristãos (1 Co 10.32).
E nem sempre um texto pode ser considerado “universal”, isto é, aplicável aos três povos.
É interessante como os “revolucionários” interpretam a Bíblia segundo os seus interesses. Se fôssemos aplicar a nós, hoje, o que diz o Salmo 149, na íntegra, teríamos de louvar a Deus com danças e uma espada na mão (literalmente), tomando vingança (literalmente) das nações! Alguém dirá: “Que exagero. A espada e a guerra devem ser aplicadas de maneira figurada”. Então, por que a dança deve ser aplicada por nós de modo literal?
Os defensores da dança também se valem de 1 Coríntios 6.20. Mas veja o que diz a Palavra de Deus, em seu contexto: “Fugi da prostituição. Todo o pecado que o homem comete é fora do corpo; mas o que se prostitui peca contra o seu próprio corpo.
Ou não sabeis que o nosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, proveniente de Deus, e que não sois de vós mesmos? Porque fostes comprados por bom preço; glorificai, pois, a Deus no vosso corpo e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus” (vv.18-20).
O que é glorificar a Deus no corpo? Significa não pecar contra Deus por meio do corpo! Somos o templo do Espírito, pertencemos ao Senhor, e nosso corpo nunca deve ser profanado por qualquer impureza ou mal, proveniente da imoralidade, nos pensamentos, desejos, atos, imagens, literaturas (2 Tm 2.22; 1 Jo 2.14-17; Sl 101.3). O texto em apreço, por conseguinte, não é uma “carta branca” para dançar ou empregar qualquer expressão corporal para glorificar a Deus.
Sei que muitos seguidores dessa “onda” me veem como um “estragaprazeres”. No entanto, reitero que não há base bíblica para o que chamam hoje de “adoração através da dança” ou “adoração extravagante”. A despeito de ainda haver igrejas mais moderadas e reverentes, a dança nunca foi uma forma de louvor a Deus, e sim uma maneira de se exteriorizar alegria ou agradar uma platéia. Lembra-se da filha de Herodias? Ela dançou para o público e agradou Herodes.
Segundo a Bíblia, Deus é exaltado por meio de cânticos, e não mediante danças (Sl 57.7). O cântico, ao contrário da dança, é atemporal, não restrito a povos e culturas (Cl 3.16; Ef 5.19). Mas os “revolucionários” pensam que o evangelho se submete à cultura dos povos. Que engano! Pensam eles, erroneamente, que o africano tem de tocar tambores na casa de Deus e que o brasileiro tem de sambar diante do Senhor…
É o evangelho de Cristo que influencia e muda hábitos culturais, e não o inverso. “Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é: as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2 Co 5.17). Fundamentalmente, não há nenhuma passagem — repito — nas páginas veterotestamentárias e também do Novo Testamento que abone, verdadeiramente, a introdução da dança no culto.
Mas, por que há tanta dificuldade em se entender isso? Por que a maioria prefere que haja danças no culto? Na verdade, os “revolucionários” priorizam a satisfação momentânea das pessoas, e não a vontade Deus. Ah, se nos conscientizássemos de que o culto é para Deus, e não para satisfazer pessoas! Como seria maravilhoso se nos convencêssemos de que a maneira de Deus falar, no culto, não é por meio de danças, coreografias, peças teatrais, e sim pela sua Palavra!
Que Deus abra os olhos desses líderes e ministros de louvor “revolucionários”, os quais se deixam levar pelo secularismo e pelos clamores do povo. Que eles reflitam melhor à luz da Palavra e cumpram a vontade do Senhor (Sl 119.105; Mt 7.21-23). E que façamos valer a oração-modelo deixada pelo Senhor Jesus: “Seja feita a tua vontade, tanto na terra como no céu” (Mt 6.10).
Sei que duro é esse “discurso”… Quantos podem dizer “amém”?
por Pr. Ciro Sanches Zibord

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